INTRODUÇÃO
Os lipomas do trato gastrointestinal são uma entidade rara descrita pela primeira vez por Baurer em 1757. Os lipomas cólicos, com origem no tecido adiposo, são tumores não epiteliais benignos extremamente raros. São mais comuns a nível do cego e cólon ascendente. 1 Lipomas cólicos com dimensão > 50 mm são designados de lipomas gigantes. Podem ser assintomáticos e, normalmente o aparecimento de sintomas está associado ao seu tamanho. Quando sintomáticos, causam alteração do trânsito intestinal, dor abdominal, hemorragia ou invaginação, sendo esta última mais comum no caso de lipomas gigantes. 2,3,4 O diagnóstico diferencial destes tumores com métodos de imagem pré-operatórios é muito importante para determinar a opção de tratamento mais adequada nesses pacientes.5
CASO CLÍNICO
Mulher de 72 anos. Antecedentes pessoais de fibrilhação auricular hipocoagulada com dabigatrano, insuficiência cardíaca, hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes mellitus tipo II e obesidade. Seguida na consulta de Gastrenterologia por anemia ferropénica, em estudo, com provável ponto de partida em angiodisplasia do cego com necessidade de terapêutica endoscópica desde 2022. No último estudo endoscópico de 2022 foi visualizado um lipoma do ângulo hepático de pequenas dimensões, ultrapassável pelo colonoscópio.
Em julho de 2023, a doente recorreu ao serviço de urgência por hematoquézia, associada a descida da hemoglobina e sem parâmetros inflamatórios. Foi realizado estudo endoscópico com progressão até ao cólon transverso onde se observava invaginação da mucosa do cólon, de coloração amarelada com ocupação quase total do lúmen, sendo inultrapassável. (Fig.1)
Figura 1 - Estudo endoscópico.
Tendo em conta este resultado, foi pedido TC Abdominopélvico que evidenciou lesão intraluminal a nível do ângulo hepático com cerca de 50 mm de maior eixo, sem adenopatias suspeitas (Fig.2).
Figura 2 - TC Abdominopélvico.
Após discussão multidisciplinar, tendo em conta o provável lipoma cólico do ângulo hepático e a angiodisplasia do cego sintomática, optou-se por propor à doente a realização de hemicolectomia direita laparoscópica de forma a solucionar ambas as patologias. A cirurgia decorreu sem intercorrências anestésico-cirúrgicas. O internamento decorreu sem intercorrências e a doente teve alta ao 5º dia pós-operatório. A anatomia patológica da peça revelou a presença de dois lipomas submucosos, um em placa com 18 x 7 x 7 mm e um polipoide com 55 x 30 x 22 mm. No cego foram identificados vasos sanguíneos tortuosos e dilatados, achados compatíveis com o diagnóstico de angiodisplasia. Os 35 gânglios da peça cirúrgica tinham estrutura preservada, sem presença de neoplasia.
Figura 3 - Peça macroscópica com evidência de lipoma polipoide.