O artigo selecionado é referente à publicação dos resultados finais do U-ACHIEVE Maintenance, um ensaio clínico de fase 3, randomizado, controlado e duplamente cego, que pretendeu avaliar a eficácia e a segurança do upadacitinib como terapêutica de manutenção na colite ulcerosa moderada a grave.
Foram incluídos 681 doentes, com idade compreendida entre 16 e 75 anos, que tinham respondido clinicamente (redução do Score de Mayo adaptado ≥2 pontos em relação ao nível basal e ≥30% do baseline, mais uma diminuição no subscore de sangue nas fezes ≥1 ou um subscore de sangue nas fezes ≤1) à fase de indução de 8 semanas, com terapêutica com upadacitinib 45mg 1xdia. Os doentes foram realocados aleatoriamente (1:1:1), placebo (n=223), upadacitinib 15 mg/dia (n=225) e upadacitinib 30mg/dia (n=233) e seguidos por 52 semanas. A remissão clínica (Score de Mayo adaptado definido como subscore de nº de dejeções ≤1 e não maior do que no início do estudo, subscore de sangue nas fezes =0 e subscore endoscópico ≤1) foi o endpoint primário.
Dos resultados apresentados destaca-se a significativa superioridade do upadacitinib face ao placebo nos seguintes endpoints:
- remissão clínica: placebo 10,8%, upadacitinib 15 mg 40,4% e upadacitinib 30mg 53,6%;
- remissão endoscópica (Mayo 0 ou 1 sem friabilidade): placebo 6,1%, upadacitinib 15 mg 24,9% e upadacitinib 30mg 28,3%;
- resolução da dor abdominal: placebo 20,6%, upadacitinib 15 mg 45,8% e upadacitinib 30mg 59,7%;
- resolução da urgência defecatória: placebo 18,4%, upadacitinib 15 mg 53,8% e upadacitinib 30mg 66,9%;
De notar que 52% dos doentes do grupo placebo e 48% dos doentes dos grupos de upadacitinib tinham previamente apresentado uma resposta inadequada/perda de resposta ou intolerância a pelo menos 1 biológico (desses, mais de 60% com falência a pelo menos 2 biológicos). O upadacitinib demonstrou ser eficaz nos endpoints clínico, endoscópico e histológico neste subgrupo de doentes. A taxa de resposta manteve-se igualmente elevada no subgrupo dos bioexperimentados, apresentando o upadacitinib 30 mg uma eficácia superior.
A análises de segurança incluiu 746 doentes (33% de doentes com pelo menos 50 anos de idade e 9% com 65 anos ou mais anos; 56% apresentava pelo menos um fator de risco cardiovascular (evento cardiovascular prévio 7%, HTA 15%, diabetes 6%, tabagismo 41% e baixos níveis de HDL 14%). Dos efeitos adversos reportados verificou-se:
- que os efeitos adversos em geral e os efeitos adversos que levaram à descontinuação do fármaco foram mais frequentes no grupo placebo (placebo n=28 vs upadacitinib 15 mg n=24 vs upadacitinib 30mg n=22 e placebo n=26 vs upadacitinib 15 mg n=11 vs upadacitinib 30mg n=19, respetivamente);
- herpes zoster: placebo n=0, upadacitinib 15 mg n=12 e upadacitinib 30mg n=16 ;
- neoplasias (incluindo neoplasia da pele não melanoma): placebo n=1, upadacitinib 15 mg n=1 e upadacitinib 30mg n=5;
- alterações hepáticas: placebo n=8, upadacitinib 15 mg n=34 e upadacitinib 30mg n=20;
- 2 eventos adversos cardiovasculares major: 1 enfarte do miocárdio não fatal (grupo placebo) e 1 hemorragia subaracnoideia (grupo upadacitinib 30mg);
- 4 eventos venosos tromboembólicos: 2 embolismos pulmonares (grupo upadacitinib 15mg) e 2 tromboses venosas profundas (grupo upadacitinib 30mg).
A análise preliminar deste estudo, com 474 doentes, foi publicada em 2022. Os resultados finais, que este estudo apresenta, incluem 681 doentes, e validam o perfil risco-benefício favorável do tratamento de manutenção com upadacitinib na colite ulcerosa moderada a grave. O upadacitinib é significativamente mais eficaz do que o placebo nos endpoints clínico, endoscópico e histológico. Quanto ao perfil de segurança, este estudo envolveu um grande número de doentes (n=746), destacando a ocorrência de eventos adversos cardiovasculares major semelhante ao placebo. Todavia, nos grupos do upadacitinib as infeções por herpes zoster e os eventos venosos tromboembólicos mantém-se superiores ao placebo.
O upadacitinib já está aprovado para a terapêutica da colite ulcerosa moderada a grave mas o seu posicionamento no algoritmo de tratamento carece de uma melhor definição. De notar que, o upadacitinib apresenta várias características que o tornam uma opção muito atrativa: toma oral uma vez por dia; rápido inicio de ação e rápido alívio dos sintomas (dor abdominal, urgência defecatória, diarreia e retorragia) e resolução da fadiga; a cicatrização da mucosa e normalização histológica; elevada eficácia nos doentes bio-naïves e nos doentes refratários a vários biológicos, suspensão precoce de corticoides e baixo risco de imunogenicidade.
As meta-análise em rede publicadas recentemente sugerem com base em comparações indiretas que o upadacitinib é a terapêutica de indução e manutenção mais eficaz para a colite ulcerosa moderada a grave, independentemente da prévia exposição a outras terapêuticas biológicas. Contudo, são necessários estudos de vida real head-to-head para clarificar e confirmar esses resultados. Não obstante, quando o placebo é utilizado como comparador, os dados apontam para a superioridade terapêutica do upadacitinib, com um bom perfil de segurança. O upadacitinib é um fármaco seguro e o único evento adverso claramente associado a este, face aos demais, é o herpes zoster, o qual pode ser mitigado com a vacina disponível para o efeito e que deve ser oferecida por prática clínica aos doentes.
Várias questões permanecem sem resposta, nomeadamente, a utilização em diferentes subgrupos de gravidade nomeadamente na colite ulcerosa aguda severa, nos doentes com manifestações extra-intestinais e a avaliação do perfil de segurança a longo prazo.
Sandra Barbeiro